domingo, 15 de setembro de 2013

Os sinos

Quando começa a semana é sempre assim. Tchau pai e tchau mãe, lancheira e manhã fresquinha. Sobe morro de pedra e vai no pomar, na mesma árvore, antes que alguém veja. A amiga já espera ali, pra contar que o namorado da irmã é feio, que os pais brigaram e que o avô não tá legal. Na árvore de trás dois meninos dão risada das conversas rosas das meninas enquanto trocam as figurinhas repetidas.
Hora de entrar. Vai marchando, correndo, andando e tropeçando. As monitoras vigiam em vão o doce e tenso entrar das crianças, ao som de shhhius e silêeencios.
Todos para o pátio, já sabem porquê.
Formando fila já, um braço de distância do colega da frente e postura. A postura é muito importante.
Todos se calam (ainda falando) enquanto a diretora discursa pra ninguém ouvir. O mesmo tédio das palavras da madame está nos ânimos dos pequenos, aquela vontade de ver tudo passar rápido e ir pra casa ver desenho e brincar.
Hora do hino.
Cada um com seu papel na mão, menos os mais espertos que já decoraram, os orgulhos da diretora.

"Que a pátria siga viva...
A esperança nas montanhas...
De lutar por nossa gente...
Ouvimos os tambores soarem..."

Eram tantos hinos que todos se misturavam. Tinha hino pra tudo. Pra pátria, pra bandeira, pros índios, pros marinheiros. Acaba o momento que era pra ser solene e volta a rotina da inquietude.
Não se pode controlar totalmente quem não tem total controle, que se guia por instintos limpos e vontades acima do esperado socialmente. Podem ter a melhor educação no lar, mas não se transformam em outra coisa a não ser na mesma criança que tanto é feliz e deseja na mesma proporção deixar de ser. Depois nos lembramos dos hinos e papos quando o que mais temos é saudade de ser o que já fomos.
Os sinos? Ainda posso escutá-los aqui me avisando que tinha que ir pra casa, e que a vida passa.


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